Niterói tem ao menos 417 terreiros sem alvará

Por três meses, o babalorixá Cristiano Pereira D’Oxóssi percorreu ruas e comunidades de Niterói em busca de locais como o seu, o Centro Espírita Pai Joaquim D’Angola. Ao fim do trabalho, ele tinha um número: 417. Esta é a quantidade de terreiros de umbanda e candomblé que existe na informalidade, sem CNPJ ou alvará para operar. O levantamento feito pelo religioso é parte do esforço da comunidade afro-brasileira, da Comissão de Combate às Discriminações da Alerj e da Defensoria Pública do Rio para legalizar estes espaços. O projeto, que já teve sua primeira fase, começou em Niterói, mas deve se espalhar por todo o estado do Rio.

— Estes 417 foram os que encontrei. Acho que existem pelo menos dois mil deles na cidade. Muitos estão escondidos — afirma Pereira. — Tentei regularizar meu terreiro em 2006, mas não consegui avançar por causa da burocracia.

De acordo com ele, os terrenos são, em sua maioria, de pessoas sem recursos para arcar com o processo de legalização. O custo estimado fica entre R$ 1.500 a R$ 2 mil. Há também falta de informação a respeito do procedimento e dos documentos necessários. O presidente da comissão da Alerj, deputado Carlos Minc (sem partido), explica que, com um mutirão, os pais e mães de santo não precisarão pagar a taxa e terão auxílio na hora de legalizar os espaços:

— O terreiro não legalizado fica vulnerável, é mais facilmente vítima de preconceito ou violência. Já legalizado, o umbandista pode participar até de convênios para obter pequenos recursos que ajudariam a manter o terreiro.

Minc afirma que o projeto começou por Niterói porque a cidade tinha em mãos o levantamento feito por Pereira. Está nos planos da comissão, porém, ampliar o alcance para São Gonçalo, Duque de Caxias e Nova Iguaçu.

Segundo Minc, pela natureza do processo, que é estadual, ele não dependeria da vontade das prefeituras. Muitos umbandistas relatam dificuldades em legalizar terreiros em cidades governadas por prefeitos evangélicos.

A primeira audiência pública, convocada pela comissão, ocorreu no auditório da UFF, dia 28 de setembro. Nela, pouco mais de 20 babalorixás e ialorixás cadastraram seus terreiros. A próxima será realizada dia 26, e a comissão espera o cadastramento de mais 50 terreiros. A ialorixá Dora Ferreira, uma das que desejam se regularizar, afirma que o objetivo maior do projeto é dar visibilidade a uma religião marginalizada.

— Quando nos legalizamos, passamos a aparecer nas estatísticas. Atualmente somos invisíveis para os institutos de pesquisa do governo — diz.

Incentivos à legalização

Procurados, os candidatos à prefeitura de Niterói se mostraram receptivos à legalização. O prefeito Rodrigo Neves (PV) afirma que a Coordenadoria de Defesa dos Direitos Difusos e Enfrentamento à Intolerância Religiosa (Codir) pode ajudar no processo:

— Todas as religiões devem ser tratadas com igual respeito e seus seguidores devem ser ouvidos por seus governantes. Toda e qualquer entidade religiosa deve estar dentro da legalidade.

Já Felipe Peixoto (PSB) adianta que deseja promover ações que incentivem os templos religiosos em geral, e não apenas os espíritas.

— Nosso objetivo é dar todo o suporte para que todos os templos consigam se legalizar. E auxiliar nos procedimentos para a regularização de imóveis, a partir das regras de licenciamento urbano e ambiental previstas na legislação municipal — diz.

FONTE: Jornal O Globo em 16/10/2016

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