Rei de Ifé, na Nigéria, vem ao Rio de Janeiro e vai discutir intolerância religiosa

Foto: Cléber Júnior / Agência O Globo


“A vinda dele é um alerta: estamos aqui e não estamos sozinhos. É uma visita de socorro”. A declaração emocionada é de Mãe Rita de Oya, do Ilê Axé Oya Yamim Axé Bangboxe. A ialorixá está na comissão que prepara a recepção para Ooni de Ifé, o rei supremo da cidade de Ifé, na Nigéria. Ele é considerado o maior representante dos iorubás no mundo.

Entre os principais assuntos abordados pelo rei, de 43 anos, durante sua visita: a intolerância religiosa.

— O mais gratificante para nós é descobrirmos que temos um rei, e que ele vem nos ouvir e perguntar aos nossos governantes o que está acontecendo com o povo dele, que sofre agressões, insultos verbais, é apedrejado — acredita Mãe Rita.

O Estado do Rio registrou um aumento de mais de 56% no número de casos de intolerância religiosa na comparação com o primeiro trimestre de 2017 e o mesmo período deste ano, segundo a Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos (SEDHMI). Nesta semana, um terreiro em Nova Iguaçu foi invadido, depredado e incendiado.

Para Marcio D´Jagun, presidente do Conselho Estadual de Defesa e Promoção da Liberdade Religiosa, a vinda do Ooni de Ifé dá visibilidade ao assunto:

— No grande leque dos assuntos dos direitos humanos, o assunto menos desenvolvido e esclarecido à população é a intolerância religiosa. A vinda dele dá possibilidade de a gente discutir, dialogar a gravidade dos fatos. As ações afirmativas têm que ser estratégicas, de difusão do problema.

A proposta da vinda do Ooni ao Brasil é reaproximar e reunir os afrodescendentes, cuja década começou em 2015 e vai até 2024, segundo a Unesco. Além da intolerância religiosa, outro tema discutido será a exclusão financeira de negros no Brasil.

Ooni chega ao Rio dia 10 de junho. Antes, vai para Salvador e Belo Horizonte. Ele virá acompanhado por uma comitiva de 150 pessoas, entre intelectuais, empresários e políticos. Aqui, será recepcionado por lideranças religiosas, políticas e pesquisadores.

Um deles será o historiador e escritor Alberto da Costa e Silva, membro da Academia Brasileira de Letras.

— Ooni tem um significado especial pela presença espiritual forte dos iorubás na vida dos brasileiros. Essa vinda fortalece o conceito de que africanos não eram bárbaros. Trouxeram com eles valores e técnicas — ressalta o imortal.

O rei de Ifé, Adeyeye Enitan Babatunde Ogunwusi Ojaja II, é descendente direto de Oduduwa, responsável pela criação do mundo, de acordo com a tradição do povo iorubá.

— Segundo uma das histórias da tradição, Oduduwa recebeu de Oludumare, o Deus supremo, a responsabilidade de criar o mundo. O início da criação aconteceu na cidade de Ilê-Ifé. Desde o estabelecimento do reino iorubá no mundo, o trono vem sendo ocupado por seus descendentes — explicou o professor de cultura iorubá da UFRJ, Carlos Henrique Veloso.A professora de História da África Mônica Lima ressaltou a importância política de Ooni de Ifé:

— Ele é o líder máximo espiritual e político daquela cidade. Mesmo que o líder político seja de outra religião, a autoridade religiosa e política do Ooni de Ifé é soberana, reconhecida. Ele dialoga com outras figuras do mundo cultural local — diz.

O atual Ooni subiu ao trono de Oduduwa em 2015. Desde então, já realizou visitas a países como Estados Unidos, Canadá, Gana, Reino Unido, entre outros.

Agenda do Ooni de Ifé no Rio

Ooni de Ifé chega ao Rio de Janeiro dia 10. No dia 11, às 10h, ele será homenageado no busto de Zumbi dos Palmares, na abertura da Feira de Cultura e Negócios Brasil-Nigéria, no Terreirão do Samba. Em seguida, participa de premiação na Alerj. Às 19h, fará um discurso à sociedade, no Teatro Municipal.

Dia 12, pela manhã, Ooni vai participar de uma cerimônia no Cais do Valongo, às 10h. Às 14h, encontra lideranças das religiões de matrizes africanas, no Teatro João Caetano. Em seguida, às 17h,será recepcionado na Academia Brasileira de Letras pelo Embaixador Alberto da Costa e Silva.

No último dia no Rio, 13, o rei vai ser recepcionado na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), às 8h30, na abertura do Colóquio Brasil – Nigéria. Ele também estará na prece Inter-religiosa pela cidade do Rio, às 11h30, no Cristo Redentor. Às 20h30, participa da despedida do Rio, no Terreirão do Samba.

FONTE: Jornal Extra em 13/05/2018


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